Velhos hábitos dificilmente morrem. Muitos são reinventados. O corte de cabelo com navalha e a utilização de toalhas quentes para fazer a barba resistiram ao tempo em minguados estabelecimentos. Agora, esta dupla é apresentada como parte de um novo conceito de barbearia, bem mais estilosa e sofisticada, em total acordo com as necessidades do homem moderno.
O estabelecimento cujo auge ocorreu entre os anos de 1880 e 1940 recebeu uma atualização que une o moderno com o vintage. São locais que recriam a barbearia do passado, com a tradicional cadeira de barbeiro, símbolo de uma das profissões mais antigas do mundo, e oferecem o que de melhor existe no quesito estética masculina.
“Os homens estão mais vaidosos que as mulheres”, constatou Fernanda Ferrari, proprietária da Barbearia Pelotense, que há três meses encontra-se em plena atividade. Eles procuraram precisão e desenho nos cortes, que podem ser inspirados tanto em jogadores de futebol como em astros de Hollywood, desde John Travolta em Grease - Nos tempos da brilhantina a Brad Pitt no recente Corações em fúria.
Essa versatilidade requer a constante atualização do profissional barbeiro em cursos profissionalizantes. Na Barbearia Estação 74, Vitor Dias explica que costuma testar nele e nos demais barbeiros do estabelecimento diferentes cortes de cabelo e modelos de barba, justamente para servir de sugestão para os clientes.
As novas barbearias comungam de um apreço pela decoração retrô. Antiguidades tomam conta dos ambientes, com poltronas, lustres, quadros e inúmeros objetos que conferem charme e um toque glamouroso a um local tipicamente masculino. Aliás, todas são exclusivas para os homens. Placas na entrada costumam alertar que o sexo feminino não é bem-vindo. “Mulheres são da porta pra fora”, brinca Lizandro Martins, da Barbearia Pelotense.
Este novo formato de estabelecimento surgiu no fim do ano passado em Pelotas e tem se propagado pelos bairros. Além da trinca de corte, cabelo e bigode, oferecem bebidas e até mesa de sinuca. Tudo para deixar os clientes mais confortáveis, num ambiente de maior identificação com seu público. Um detalhe: as barbearias não funcionam com agendamento. É só chegar e ser atendido. Ou esperar uns minutos, o que certamente não será um problema.
Uma viagem no tempo
A primeira barbearia estilosa na cidade foi a Retrô, localizada na Guabiroba e que inaugurou em agosto do ano passado. Segundo o proprietário Maruã Dutra Vidal, a principal influência para montar seu estabelecimento foi a 9 de Julho, em São Paulo. Decidiu apostar no negócio já que não existia nada semelhante em Pelotas.
A primeira barbearia estilosa na cidade foi a Retrô, localizada na Guabiroba e que inaugurou em agosto do ano passado. Segundo o proprietário Maruã Dutra Vidal, a principal influência para montar seu estabelecimento foi a 9 de Julho, em São Paulo. Decidiu apostar no negócio já que não existia nada semelhante em Pelotas.
Maruã vem de uma família de barbeiros, o que foi mais um estímulo para seguir a tradição de gerações. Ele adquiriu prática após acompanhar o dia a dia de seu tio, profissional da Barbearia Vidal, instalada no Mercado Central. A ideia inicialmente era abrir o empreendimento no Centro, mas decidiu investir na localidade que vive há 31 anos. Deu certo. Precisou, inclusive, ampliar seu espaço.
A Retrô Barbearia apresenta-se como um clube para cavalheiros. Ou seja, um ponto de encontro para os clientes, que podem jogar uma partida de sinuca e beber uma cerveja. A ideia é cada vez mais aliar esse lado pub ao salão masculino. No verão pretende colocar mesas na rua e adquirir uma máquina de fliperama.
Essas atrações visam entreter os frequentadores e promover a confraternização entre eles, enquanto esperam a sessão estética. Obedecendo, é claro, a temática do passado. A decoração inclui uma motocicleta, cadeiras de cinema, frigidaire anos 1950 e uma cadeira de barbeiro de 1918.
Esta decoração promove, segundo Vidal, uma viagem no tempo. Pais levam os filhos para cortar o cabelo e apresentam como era a vida antigamente. Outros são atravessados por lembranças. Alguns clientes empolgam-se e chegam a doar objetos. “A ideia é forrar todas as paredes”, conta o jovem barbeiro.
Mesmo na Guabiroba, na rua Irmão Fernando de Jesus, 25, a Retrô Barbearia recebe público de diferentes regiões da cidade. Por isso, Maruã expandiu o empreendimento com uma segunda unidade localizada na rua Almirante Barroso, 1.434, sob comando de seu irmão.
De suspensórios e gravata
Há seis meses, uma pequena garagem na rua General Telles foi transformada na Barbearia Estação 74, espaço que adota um estilo classudo e vintage no qual até mesmo os barbeiros vestem-se de maneira old school, com camisa, calça, suspensórios e gravata.
Há seis meses, uma pequena garagem na rua General Telles foi transformada na Barbearia Estação 74, espaço que adota um estilo classudo e vintage no qual até mesmo os barbeiros vestem-se de maneira old school, com camisa, calça, suspensórios e gravata.
O proprietário Lucas Dezordi começou na profissão cortando o cabelo dos amigos, em casa mesmo. Fez curso para cabeleireiro e chegou a trabalhar em um salão unissex, mas percebeu que gostava de lidar com o público masculino.
Logo veio a vontade de abrir uma barbearia para oferecer cortes e barbas tradicionais e inovadoras. Hoje fica bravo quando é chamado de cabeleireiro ou se referem ao seu estabelecimento como salão.
A Estação 74 conta com duas cadeiras de barbeiro, mas uma terceira em breve deve somar-se a elas, até porque são três profissionais atuantes no local. Além de Lucas, Vitor Dias e Mário Pereira Júnior trabalham mantendo a tradição do ofício, estimulando a popularização das toalhas quentes na hora de fazer a barba e o uso da navalha nos cortes, mesmo que com lâminas descartáveis.
Mais que um lugar de cuidados pessoais, o ambiente diferenciado da barbearia também se tornou um local de reunião. “Muitos nem vêm para cortar cabelo. Estão aqui para conversar, escutar um rock e tomar uma gelada”, comenta o amigo e também cliente João Szechir.
Bom gosto à la Elvis Presley
Quando as portas da Barbearia Pelotense foram abertas, os moradores da Santa Therezinha ficaram receosos. Achavam que era um lugar chique e que deveria ser caro. “Não é nada chique. O que tem aqui é bom gosto. Tudo antigo, com essa pegada retrô. E os preços são acessíveis”, explica o barbeiro Lizandro Martins.
Quando as portas da Barbearia Pelotense foram abertas, os moradores da Santa Therezinha ficaram receosos. Achavam que era um lugar chique e que deveria ser caro. “Não é nada chique. O que tem aqui é bom gosto. Tudo antigo, com essa pegada retrô. E os preços são acessíveis”, explica o barbeiro Lizandro Martins.
O próprio explica que esse novo conceito de barbearia iniciou por volta de 2005 em São Paulo, um modelo importado dos Estados Unidos, onde o costume é bem forte. A decoração também possui o apelo para as antiguidades, por isso, a Pelotense coloca em destaque as cadeiras de barbeiro, que, segundo Lizandro, substituem qualquer outra em conforto e agilidade.
O espaço foi cuidadosamente planejado. Tanto Lizandro como sua esposa, Fernanda, proprietária do estabelecimento, fizeram questão de adquirir alguns símbolos da profissão. O barber pole, objeto norte-americano para identificar uma barbearia, encontra-se ao lado do espelho. Na segunda mesa, materiais do ofício utilizados no passado. O piso xadrez preto e branco, característico deste tipo de local, também foi uma exigência.
O barbeiro diz que, apesar da experiência recente, a profissão é apaixonante e precisa estar sempre atento às novidades. Segundo ele, a mídia, principalmente televisão e cinema, influencia nas escolhas de corte de cabelo e formatos de barba.
Lizandro apresenta três que são os mais pedidos: undercut (comprido em cima, laterais raspadas), fade (comprido em cima, degradê nas laterais) e pompadour (topete volumoso no topo da cabeça). Todos estilo rockabilly. “Os consumidores estão mais exigentes que antigamente”, afirma a dupla.
Assim como as demais barbearias, a proposta da Pelotense também inclui trocar uma ideia com o cliente. “Não oferecemos wi-fi justamente para incentivar a conversa”, comenta Lizandro. Uma cerveja pode ajudar para quebrar o gelo. Por isso, a primeira long neck é por conta da casa. Grupos, como de colecionadores de carros antigos e apreciadores de antiguidades, já costumam frequentar o local na rua Santa Clara, 679.
A pretensão é ampliar o empreendimento, a começar com a contratação de um segundo profissional. Porém, de acordo com Fernanda, a mão de obra especializada não está fácil de encontrar. Uma boa notícia é que o Senac começou este mês a oferecer curso de barbeiro. A segunda cadeira está à espera de seu comandante.
Depois desta primeira expansão, os proprietários querem focar na ideia de clube, oferecendo salão de jogos e bar que inclua alimentação. Também está nos planos dispor de outros serviços, como depilação e massagem. Tudo 100% masculino, voltado ao bem-estar do homem moderno, que gosta de se cuidar e não necessariamente é obcecado pela beleza.